12 de outubro de 2010
Solidão contente
O que as mulheres fazem quando estão com elas mesmas
Ontem eu levei uma bronca da minha prima. Como leitora regular desta coluna, ela se queixou, docemente, de que eu às vezes escrevo sobre “solidão feminina” com alguma incompreensão.
Ao ler o que eu escrevo, ela disse, as pessoas podem ter a impressão de que as mulheres sozinhas estão todas desesperadas – e não é assim. Muitas mulheres estão sozinhas e estão bem. Escolhem ficar assim, mesmo tendo alternativas. Saem com um sujeito lá e outro aqui, mas acham que nenhum deles cabe na vida delas. Nessa circunstância, decidem continuar sozinhas.
Minha prima sabe do que está falando. Ela foi casada muito tempo, tem duas filhas adoráveis, ela mesma é uma mulher muito bonita, batalhadora, independente – e mora sozinha.
Ontem, enquanto a gente tomava uma taça de vinho e comia uma tortilha ruim no centro de São Paulo, ela me lembrou de uma coisa importante sobre as mulheres: o prazer que elas têm de estar com elas mesmas. “Eu gosto de cuidar do cabelo, passar meus cremes, sentar no sofá com a cachorra nos pés e curtir a minha casa”, disse a prima. “Não preciso de mais ninguém para me sentir feliz nessas horas”.
Faz alguns anos, eu estava perdidamente apaixonado por uma moça e, para meu desespero, ela dizia e fazia coisas semelhantes ao que conta a minha prima. Gostava de deitar na banheira, de acender velas, de ficar ouvindo música ou ler. Sozinha. E eu sentia ciúme daquela felicidade sem mim, achava que era um sintoma de falta de amor.
Hoje, olhando para trás, acho que não tinha falta de amor ali. Eu que era desesperado, inseguro, carente. Tivesse deixado a mulher em paz, com os silêncios e os sais de banho dela, e talvez tudo tivesse andado melhor do que andou.
Ontem, ao conversar com a minha prima, me voltou muito claro uma percepção que sempre me pareceu assombrosamente evidente: a riqueza da vida interior das mulheres comparada à vida interior dos homens, que é muito mais pobre.
A capacidade de estar só e de se distrair consigo mesma revela alguma densidade interior, mostra que as mulheres (mais que os homens) cultivam uma reserva de calma e uma capacidade de diálogo interno que muitos homens simplesmente desconhecem.
A maior parte dos homens parece permanentemente voltada para fora. Despeja seus conflitos interiores no mundo, alterando o que está em volta. Transforma o mundo para se distrair, para não ter de olhar para dentro, onde dói.
Talvez por essa razão a cultura masculina seja gregária, mundana, ruidosa. Realizadora, também, claro. Quantas vuvuzelas é preciso soprar para abafar o silêncio interior? Quantas catedrais para preencher o meu vazio? Quantas guerras e quantas mortes para saciar o ódio incompreensível que me consome?
A cultura feminina não é assim. Ou não era, porque o mundo, desse ponto de vista, está se tornando masculinizado. Todo mundo está fazendo barulho. Todo mundo está sublimando as dores íntimas em fanfarra externa. Homens e mulheres estão voltados para fora, tentando fervorosamente praticar a negligência pela vida interior – com apoio da publicidade.
Se todo mundo ficar em casa com os seus sentimentos, quem vai comprar todas as bugigangas, as beberagens e os serviços que o pessoal está vendendo por aí, 24 horas por dia, sete dias por semana? Tem de ser superficial e feliz. Gastando – senão a economia não anda.
Para encerrar, eu não acho que as diferenças entre homens e mulheres sejam inatas. Nós não nascemos assim. Não acredito que esteja em nossos genes. Somos ensinados a ser o que somos.
Homens saem para o mundo e o transformam, enquanto as mulheres mastigam seus sentimentos, bons e maus, e os passam adiante, na rotina da casa. Tem sido assim por gerações e só agora começa a mudar. O que virá da transformação é difícil dizer.
Mas, enquanto isso não muda, talvez seja importante não subestimar a cultura feminina. Não imaginar, por exemplo, que atrás de toda solidão há desespero. Ou que atrás de todo silêncio há tristeza ou melancolia. Pode haver escolha.
Como diz a minha prima, ficar em casa sem companhia pode ser um bom programa – desde que as pessoas gostem de si mesmas e sejam capazes de suportar os seus próprios pensamentos. Nem sempre é fácil.
IVAN MARTINS
editor-executivo da revista Época
23 de março de 2010
Oscilações De Um Tempo
Por Jussara
Nosso tempo.
Tempo da competitividade alimentada pelo individualismo e consumismo, passaporte para a busca da independência e autonomia; com propósito do poder para suprir carências afetivas, carências da alma . Tempo das vaidades que servem como máscaras, que desde cedo se aprende a usar, gerando a ilusão de que se é aceito e querido. Tempo em que poder e prosperidade são garantias de aceitação numa sociedade cuja mentalidade gira, gira e cai na futilidade contemporânea.
Sob esses aspectos, relacionamentos são construídos com estranhos mascarados que não valem pelo que são, e sim pelo que fazem, pelo tem; pelo que aparentam.
Esconde-se, efetivamente, o que prejudica a imagem fabricada, condição de ser aceito no mundo ideal, onde a honestidade está escondida no quarto escuro da alma, aprisionando consigo a liberdade e a dignidade.
Crianças. Crianças são aquilo que desejam ser quando crescerem. Idosos são marginalizados e abandonados, pois já não produzem, não geram riquezas.Pobres; os pobres de dinheiro, pobres no físico, os pobres de conhecimento. São tantos os pobres. E estes, estes são um problema a ser resolvido, e não pessoas para serem amadas. Suportam o peso da indiferença, não pertencem ao universo do tempo real.Em tempo de profundas instabilidades, critérios de verdadeiros relacionamentos são questionáveis, mesmo em ambientes em que o discurso e a prática deveriam andar de mãos dadas.O tempo, como um ralo enorme, escoa tudo com ele, tudo se vai.
O que deveria ficar ? A simplicidade. É só na simplicidade que se consegue enxergar a significância real da vida, a siginificância de um tempo que não devolve o que se perdeu, um tempo que não volta jamais. Um tempo que nos fará lamentar o tempo perdido.
27 de janeiro de 2010
A Lista
a lista
osvaldo montenegro
Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais...
Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você desistiu de sonhar!
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar...
Onde você ainda se reconhece
Na foto passada ou no espelho de agora?
Hoje é do jeito que achou que seria
Quantos amigos você jogou fora?
Quantos mistérios que você sondava
Quantos você conseguiu entender?
Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos ninguém quer saber?
Quantas mentiras você condenava?
Quantas você teve que cometer?
Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você?
Quantas canções que você não cantava
Hoje assobia pra sobreviver?
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você?
18 de janeiro de 2010
Tempo que Foge
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a “última hora”; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.
Caminhar perto dessas pessoas nunca será perda de tempo.
(Ricardo Gondim)
fonte: http://foradazonadeconforto.blogspot.com/2009/11/tempo-que-foge.html
Haiti...
http://www.oquevivipelomundo.blogspot.com/
17 de janeiro de 2010
“Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.”
(poema pertencente ao livro Cânticos, de 1927)